MUITO BARATO, NÉ?


Baixinha. Cabelos curtos, lisos. Olhinhos semicerrados. Sorriso permanente que destacava dois dos seus largos dentes superiores frontais.
Assim era a divertidíssima senhora originária lá da terra do sol nascente. De cidadania brasileira, ela tratava cada uma das mulheres do seu grupo por Patrícia e os homens por Patrício. Se, pra nós, no hotel, fosse permitida tamanha intimidade, ficaria mais fácil chamá-los dessa forma, ao invés de Fujimoto, Mitsubishi ou Hanashiro. Esta japonesa chegou no hotel quase sem bagagem pessoal, no comando de sua Nissan com um espaço interno tão amplo que só não chegava a fazer eco devido a duas grandes caixas de papelão acomodadas no piso do porta-malas. E, enquanto que os seus Patrícios e Patrícias ficavam reservados a toda discrição oriental, ela saía ávida pela cidade à caça de comércio popular. Ela era fissurada em 1,99. Dali a pouco ela chegava carregada de bugigangas e bijuterias que iam desde miçangas diversas, até pulseirinhas coloridas de significados pejorativos. Olhava pra gente, abria ainda mais o sorriso e acabava cerrando, por completo, os seus minúsculos e puxados olhinhos, dizendo:
— Muito barato, né?
Numa visível e saudável inquietude, de tardezinha ela correu num supermercado e voltou nos mostrando um pacote de farinha de trigo, sorrindo e dizendo:
— Muito barato, né?
Subiu, se arrumou, e desceu com a farinha numa sacola, passando pela recepção, andando meio de lado, igual um siri, curvando a cabeça pra frente, como se estivesse nos reverenciando. Saiu e foi para o salão comunitário da Matriz. Não sei como foi que ela ficou sabendo que lá ia ter um bazar beneficente com show popular onde a entrada era um quilo de alimento não perecível.
Quando ela e os seus Patrícios e Patrícias foram embora do hotel, a mesma já tinha acumulado mais uma caixa gigante dentro da Nissan.
Tomara que tenham ido direto pra casa. Senão ela poderia até ser multada na estrada por excesso de volumes de itens populares e “muito barato, né?”