O PECADO DORME AO LADO


Mais uma vez, aquele casal, comerciante de joias folheadas, dava entrada no hotel naquele anoitecer. Não fosse a cara de Didi Mocó que o marido tinha, alguém poderia até confundir a esposa dele com a estonteante Ellen Roche. A mulher era a cara e o corpão da Ellen. Sujeito de sorte o marido dela. Quem não estava com essa bola toda, era um rapazinho, do mesmo ramo, que já se encontrava a alguns dias hospedados no hotel e ficou pasmo com a saúde da Ellen. Com aqueles seus olhos de peixe morto e queixo caído, o carinha era recém-casado e o patrão dele não estava nem aí: fazia o coitado viajar feito um louco atrás de clientes, o deixando dias a fio distante de sua recém-esposa. Particularmente, defendo que deveria ter um acordo na CLT proibindo essa tortura contra casadinhos de novo. A situação do rapaz era simplesmente deplorável. Um pecado. E, como desgraça pouca é bobagem, a Ellen com o sósia do Didi Mocó, se acomodaram no apartamento vizinho ao do azarado.
No dia seguinte ele estava reclamando:
— Caramba, dormi mal pra dedéu! Aquela mulher do lado gemeu até tarde da noite. Por que não dormem num motel? A mulher deveria gemer um pouquinho mais baixo. Isto é falta de respeito. Eu procuro não perturbar o meu vizinho com qualquer tipo de barulho que seja. Você, na sua casa, perturba o seu vizinho com algum tipo de barulho?
— Só quando o Palmeiras joga e faz gol — expliquei pra ele. — O meu vizinho, que é corintiano, se sente perturbado em me ver tão feliz. Se o Palmeiras ganha qualquer jogo, então, ele fica uns três dias sem falar comigo. Mas, quando é o time dele que ganha uma partida, daí ele perturba o quarteirão inteiro, berrando e soltando rojão sem parar.
— Até quando aquele casal ficará hospedado aqui? — quis saber o indignado.
— Geralmente, eles vão embora depois de dois ou três dias. Se você quiser, eu posso te transferir de apartamento...
— Não. Fico lá mesmo.
Na noite seguinte, numa das vezes em que a esposa dele ligou, ele estava na recepção e atendeu ali mesmo, dizendo:
— Oi amorzão. Agora me restam apenas mais dois clientes pra visitar. Amanhã mesmo estarei voltando aí pra casa. Devo estar chegando até mais cedo do que cheguei na sexta passada... Te amo. Tô morrendo de saudades.
— (...) — Ela, a esposa, deve ter dito que estava também.
— Ah, eu estou mais. Você nem imagina! — arrepiou o coitado.
Só faltou ele dizer pra ela: “Vai te preparando. Pois, secão do jeito que estou, serei capaz de te virar pelo avesso assim que eu chegar aí”.